Breve História do Corpo e de Seus Monstros

11/06/2009

Fotografia sem nome, de Cindy Sherman

Fotografia sem nome, de Cindy Sherman

Minha orientadora me emprestou uma série de livros com temas relevantes para o meu TCC.  Um deles chama-se “Breve História do corpo e de seus monstros“, de autoria de Ieda Tucherman. O exemplar da professora foi por ela mesmo definido como “meio desmontado”: está completamente sublinhado, desenhado, MUITO BEM usado. E ainda contém uma dedicatória da autora. Como eu tenho esse mesmo costume de USAR BEM meus livros, preferi encomendar meu exemplar para não estragar o dela. Mas enquanto ele não chega, leio o emprestado mesmo e me aproveito das anotações feitas por outras pessoas. As minhas ficam em post-it. Um trecho:

“Quem somos nós, humanos? Já as novas tecnologias biomédicas, as novas teorias de neurofisiologia cerebral, a profusão de próteses conectáveis ou implantáveis com as quais nos hibridizamos, as clonagens e as experiências que superaram as determinações da espécie e só fazem pôr em questão as mais antigas noções de humanidade e as nossas determinações mais radicais: a saber, mortalidade, singularidade e sexualidade.

Em relação à mortalidade, a nossa finitude constitutiva da experiência da Modernidade, cuja elaboração podemos reconhecer nas questões kantianas a partir da radicalidade do limite como nosso próprio corpo: o que posso conhecer? O que posso desejar? O que posso esperar? Parece estar sob suspeição. Assim como as intervenções protéticas e o processo de duplicação tornam possível o adiamento ou a superação da mortalidade, à condição que o homem perca suas pretensas características de ser natural, portador de singularidades próprias, pois para postular-se como imortal é possível que o homem seja “em seu próprio corpo”, puro artefacto, as questões que nos constituíam tornam-se anacrónicas ou obsoletas. Talvez não estejamos totalmente preparados, mas é sem dúvida preciso conceber as novas questões que se fazem necessárias. Entre elas, talvez a mais significativa seja: o que é ser um corpo? ou O que é ter um corpo? Que possibilidades hoje nos são abertas e que experiências nos são possíveis?

Quanto à singularidade, ela relacionava-se imediatamente com a experiência de finitude, de corpo e modo de ser próprios. E o processo de globalização, que configura o que chamamos de sociedade de controle, parece ter como premissa lógica para o seu funcionamento a nossa des-singularização. Somos agora senhas, que falam do nosso lugar no sistema, que é o que interessa para a operacionalidade do mundo que tem como alma a empresa, como somos conexões no regime da cibercultura. “Eu sou na medida das minhas conexões” parece ser o que hoje define a nossa subjectividade, assim como o nosso corpo.

No que se refere à nossa sexualidade, nós orgulhamo-nos do movimento político que nos permitiu destacá-la da reprodução, a nossa tão festejada revolução sexual que afirmava em nós a liberdade de seres de desejo. Mas não estávamos, parece, preparados para não sermos mais responsáveis pela vida e pela continuidade da espécie. Tudo parece supor que a ordem mundial na sua mais intensa radicalidade não depende mais do homem, condenado então a ‘funções inúteis’.”

Lembrei-me de que um ensaio sobre Leonardo Da Vinci fala sobre a forma e a função do corpo. Fui buscar e achei o trecho (p. 84):

“Embora o engenho humano conceba invenções diversificadas, que correspondem, por meio de várias máquinas, ao mesmo fim, nunca descobrirá invenções mais belas, mais apropriadas ou mais diretas que a natureza, porque no que ela inventa nada há que falte ou que seja supérfluo”

* * *

Enciclopédia dos Monstros, de Gonçalo Junior

Enciclopédia dos Monstros, de Gonçalo Junior

Ainda falando sobre isso, mas não muito,  ganhei recentemente a “Enciclopédia dos Monstros“. Adorei! A capa é meio juvenil demais, é verdade. Preferia uma capa preta, com letras prateadas e só. Acho mais clássico. Mas isso não é um defeito do presente, e sim da publicação. No mais, fotos, muitas fotos, a evolução da idéia de monstro, e as histórias de vida (?) de seres conhecidos na literatura, no cinema, nas HQs, na natureza. Há páginas também sobre os circos e espetáculos itinerantes que entre o final do século XIX e a primeira metade do século XX atraiam a curiosidade mórbida do público expondo pessoas com deformidades congênitas. Os monstros folclóricos brasileiros também aparecem: Boitatá, Curupira, Saci-pererê. Em alguns há mais de humano do que de monstro. Frankenstein me adoraria por dizer isso, eu sei. Mas sobre isso também posso citar o Edward Mãos-de-Tesoura (categoria bonzinhos), e o ET (categoria Monstros Infantis). Melhor presente!

:)

10 Respostas to “Breve História do Corpo e de Seus Monstros”


  1. Morri de inveja dessa enciclopédia de monstrinhos. Adorei ver um post novo no teu blog, tava com saudades já.
    Bjs!

  2. joao~grando Says:

    Cindy Sherman perfeito para ilustrar um humano falso.

  3. Diego Viana Says:

    Adorei as citações. Aproveito pra sugerir dois autores que, pelo visto, vão te interessar: Gilbert Simondon e Bernard Stiegler.

    Bjs
    Diego


  4. Curti muito o post. Um livrinho de que gosto muito, e que pode ser útil a você, é “A Filosofia do Corpo”, de Claude Bruaire. (Só disponível na Estante Virtual, eu acho. Mas se você precisar dele e não o achar, me avise.)

    Curiosamente, ‘tava folheando hoje o livro do Umberto Eco, que é perfeito pra consultas rápidas, “História da Feiura”. Eu li uns capítulos dele pra escrever isso: http://twitter.com/digestivo/status/3579942016

    Se essa “Enciclopédia dos Monstros” lhe agradou, com o livro do Eco você vai pirar Hhehehe

    Beijinho, bom fim de semana

  5. Ewerton Says:

    Oi, Chris.

    Pode parecer estranho, mas em uma pesquisa acadêmica que estou fazendo para um artigo caí em seu blog e tive contato com este livro de Ieda Tucherman. Por isso, procurei em todos os lugares, mas não o encontrei. Se por acaso, você pudesse me ajudar de alguma forma a ter contato com este material, ficaria muito grato…

  6. Ed Says:

    Ah, que máximo: eu também também tenho esse ‘enciclopédia dos monstros’ :-) Comprei por R$20 numa banca de revista, maior barato. Achei também que a capa podia ser melhor, but ok. Abraço e bom final de ano, Cris.

  7. natusch Says:

    Incrível que tu não publica nada aqui há meses e mesmo assim eu visito esse blog de vez em quando. E sempre acho algo muito legal que (vergonha!) eu ainda não tinha lido =)

    Beijos, nos vemos em breve no gigante cinzento!

  8. Gabriel Says:

    Passei pra dar um alô…pra relembrar os tempos que antes que aqui constantemente passava….e ai nao escreverá mais por essas plagas? saudades de tuas escritas..ou será que tudo agora eh twitter? espero qeu nao…sera que os blogs estao condenados a morte? ahahahha…espero que nao..

  9. luma rosa Says:

    Você sumiu :( Mande notícias.

  10. Cris Says:

    Sumi =(
    Passou. Venho pouco ainda, nunca pra escrever. Agora passo o dia escrevendo a trabalho, e cadê cabeça e olhos pra escrever mais à noite? Pena. Bom ver que alguém ainda passa por aqui. Fico feliz e com saudade. Beijo, Luma. Nos “vemos” por aí, pela rede.


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