Archive for the 'Cotidiano florido' Category

Não foi no sétimo dia que a vida fez sentido

31/03/2009

Tenho pensado em me dedicar a outro blog, de teor profissional. Algo que esteja mais próximo do meu trabalho, sem tanta música, sem tanto ruído, sem o calor do momento.  O Usina desde o início, lá em 2005, falou de tudo um pouco. Fez rodeios em cinema, literatura, música, muita música. E falou de mim, da vida, das coisas da minha vida. Não achei ruim, e ainda fico com dó quando passo tempos sem atualizá-lo, mas percebi que isso de me sentir mal por ficar longe daqui faz parte de uma necessidade angustiante minha de guardar tudo em algum lugar. O que pode e o que não pode ser guardado. E isso incomoda. As coisas são bonitas. Lindas. As coisas guardadas aqui são queridas. Mas preciso de um tempo para me renovar. Essa é a verdade. Enfim. Ando pensando em me dedicar a outro blog. Talvez eu consiga, ainda que num ritmo tartaruga, levar os dois juntos. E aquele, por estar mais próximo do meu cotidiano, dos meus estudos, seja privilegiado.

Depois do desabafo. Posso falar dos discos do Explosions in the Sky?

Explosions in The Sky - the band

Explosions in The Sky - the band

Se não me engano, conheci a banda através da Pandora, rádio online que infelizmente parou de disponibilizar acessos para ouvintes de fora dos EUA. (e agora o Last.fm… Pelo menos o Last.fm deu a opção  de podermos assinar. Assinarei).

Fui baixando álbum por álbum. Na época eu ainda trabalhava durante a madrugada (dá-lhe vinas. sistema caindo. a madrugada não descansa da roda viva). Chegava em casa não antes das 3h da manhã. A questão é que o corpo não dorme depois que se acostuma às linhas e às colunas, tabelas, à exatidão. Eu sentia que dormir seria um atraso. E então Explosions in The Sky fazia o trabalho sujo, que era mudar todo o meu fuso e me colocar na cama. São algumas das canções mais passionais que eu já ouvi. Quase não tem voz, só amor, tragédia e catarse.  Não tem rastro corpóreo. O som é instrumental e metálico mesmo.

2009 é o ano do décimo aniversário da banda. Eles começaram a tocar juntos em 1999, e em 2000 gravaram o primeiro disco. Vou me dar ao trabalho de colocar todas as capas dos álbuns, e todos os nomes das músicas aqui. Vale muito a pena. Os títulos são demais! Grifei os que eu acho mais bonitos.

how-strange-innocence

How Strange, Innocence (2000)

1. A Song For Our Fathers ——>MEHOR MÚSICA.
2. Snow and Lights
3. Magic Hours
4. Look Into The Air
5. Glittering Blackness
6. Time Stops
7. Remember Me As A Time Of Day

It sounds strange to say that instrumental songs are about something, but to us these songs were/are about such things as a couple walking through the park on a winter day, a child playing on 70’s shag carpet, the story of a boy hero leading a revolution against the tyranny of the coal mines. We’ve had a bit of a love/embarrassment relationship with the record.

(Texto tirado da página oficial da banda)

Those Who Tell the Truth Shall Die, Those Who Tell the Truth Shall Live Forever (2001)

Those Who Tell the Truth Shall Die, Those Who Tell the Truth Shall Live Forever (2001)

1. Greet Death
2. Yasmin the Light
3. The Moon is Down
4. Have You Passed Through This Night?
5. A Poor Man’s Memory
6. With Tired Eyes, Tired Minds, Tired Souls We Slept

The Earth Is Not A Cold Dead Place (2003)

The Earth Is Not A Cold Dead Place (2003)

The Earth is Not a Cold Dead Place é o único  álbum da banda em que todas as músicas ultrapassam a marca de 8 minutos.  É também o álbum que, se não me engano, tem a música preferida da Gressi: “First Breath After Coma“.

1. “First Breath After Coma” – 9:33
2. “The Only Moment We Were Alone” – 10:14
3. “Six Days at the Bottom of the Ocean” – 8:43
4. “Memorial” – 8:50
5. “Your Hand in Mine” – 8:17

Friday Night Lights - LP Cover

Friday Night Lights - LP Cover

Original Motion Picture Soundtrack Friday Night Lights - CD Cover

Original Motion Picture Soundtrack Friday Night Lights - CD Cover

“Every once in awhile someone asks us how we ended up working on a big studio movie about football. The simplest answer is that we got an email. This particular email was from Brian Reitzell who was the music supervisor for both The Virgin Suicides and Lost In Translation (two movies that we are quite fond of). He said he was working on a new movie and he was wondering if we would be interested in doing music for it. We told him we would. He got back in touch with us a few days later and told us that the movie he was working on was called Friday Night Lights. He didn’t really have to explain much as we were somewhat familiar with the book and even more familiar with the setting of the story. West Texas. Midland and Odessa. This is the part of Texas where three out of the four of us grew up. We all read the book and we loved it. It was sad and joyful and depressing and triumphant and funny and ugly and exciting. We said yes.

1. From West Texas
2. Your Hand In Mine (w/strings)
3. Our Last Days As Children
4. An Ugly Fact of Life
5. Home
6. Sonho Dourado (Daniel Lanois)
7. To West Texas
8. Your Hand In Mine (Goodbye)
9. Inside It All Feels The Same
10. Do You Ever Feel Cursed (David Torn)
11. Lonely Train
12. Seagull (Bad Company)
13. The Sky Above, The Field Below
14. A Slow Dance

The Rescue (2005)

The Rescue (2005)

Acho a capa do The Rescue totalmente desesperada. Urgente. É autoexplicativa.

“This is an album of cathartic, beautiful, sweeping, emotionally-charged post rock, that builds from moments to dream-like, ethereal beauty, to grandiose, triumphant, uplifting passages. As with all Explosions in the Sky material, this is HIGHLY recommended. Temporary Residence Limited. “

Não foi no sétimo dia que a vida fez sentido.

1. Day One
2. Day Two
3. Day Three
4. Day Four
5. Day Five
6. Day Six
7. Day Seven
8. Day Eight

All of A Sudden I Miss Everyone (2007)

All of A Sudden I Miss Everyone (2007)

“Here are a few of the key ingredients:

Dilapidated swimming pool which held no water, a dangerous bonfire fueled by lighter fluid and tended by inexperienced outdoorsmen, a babbling brook, Trailer Park Boys seasons 1 – 5 (and the Christmas special), two hammocks, TRAILS INTO THE FOREST, wild turkeys, torrential downpours, elaborate breakfasts, the best backporch in the world, a dangerous snake on the loose inside the house, a trip to the Mall of America, A GHOST, and a ride on a rollercoaster.”

1. The Birth and Death of The Day
2. Welcome, Ghosts (mp3)
3. It’s Natural To Be Afraid
4. What Do You Go Home To?
5. Catastrophe and the Cure
6. So Long, Lonesome

Love,
Explosions

“I Love Your Lovin’ Ways”

10/01/2009

nina

Bah, eu nem sei se ainda tenho credibilidade por aqui, já que não escrevo há mais de um mês. Mas vamos lá. Pretendo desenferrujar a ferramenta de publicação de posts deste blog. Primeiro) desejando um ano incrível para todos que por aqui passarem (os que por aqui não passarem não merecem um bom ano). Segundo) dizendo que NÃO, eu não derrubei xícara nenhuma de café no teclado no meu primeiro dia de trabalho. Por sinal, lá tem máquina de café e agora eu tomo mais de um capuccino por dia sem pagar nada por isso. Babem. Terceiro) o saldo de fim de ano foi positivo, bem positivo. Troquei de emprego, entendi, aprendi,  li mais, continuei vestindo a cor preta tanto quanto em 2007, mas terminei o ano com olhos verdes de presente. Entrei em 2009 com pagode. Nem eu me reconheço. Pula a parte do pagode. Ou deixa assim.

Ainda sobre o início de 2009, se vocês levarem as novas regras ortográficas na ponta do lápis, talvez encontrem algum TREMA por aqui. Não me preocupo com isso. Não se preocupem. Temos até 2012 para (re)aprender a escrever corretamente. Que reforma mais absurda!

Mudemos de assunto. O que eu quero agora é falar da cantora que mais me acompanhou em 2008: Eunice Kathleen Waymon. Popularmente falando, Nina Simone.  Ela é minha deusa desde que eu assisti à cena de Before Sunset (2004) em que a Celine (Julie Delpy) prepara uma xícara de chá para o Jesse (Ethan Hawke). Sinceramente, nem procurei a cantora pela música que tocava na cena; procurei por causa do nome mesmo. Achei “Nina Simone” um nome bonito. Com o tempo fui vendo que a dona de um bom nome artístico tinha também uma boa voz. E que a voz dela tinha uma pontinha de tristeza, um lirismo rouco que me fascinava. E assim ela foi tomando conta de algumas das minhas horas, geralmente de descanso.

Nascida na cidade de Tryon (estado norte-americano da Carolina do Norte) em 1933, Nina Simone assim se autodenominou porque se achava pequena, menina (do espanhol, Niña). Achando-se pequena, fez sua “pequena”  homenagem a Simone Signoret, a grande atriz do cinema francês. Pianista, compositora e cantora, Nina Simone adotou nome artístico aos 20 anos, para que pudesse cantar a “música do diabo”, BLUES, nos cabarés de Nova Iorque e Filadélfia escondida de seus pais, pastores metodistas. Nos anos 50, foi uma das primeiras artistas negras a ingressar na conceituada escola de piano Julliard School Of Music, de Nova Iorque. Foi mais ou menos nessa mesma época que ela começou a acompanhar artistas na noite de Atlantic City, e também nesse tempo que se viu obrigada a continuar cantando para garantir o sustento da família. A obrigação, por fim, virou prazer.

Embora tenha transitado por blues, soul, gospel e folk, foi pelo jazz que ela ganhou cena entre as mais importantes cantoras do mundo, gravando mais de 60 discos. Ao abraçar publicamente todo tipo de combate ao racismo, Nina Simone também se destacou e foi perseguida. Envolveu-se de tal forma, que chegou a cantar no enterro do amigo Martin Luther King. Em suas memórias, a cantora declarava sua vontade: “Meus amigos estão todos mortos ou no exílio. Se pudesse ter escolhido, teria sido assassina, teria respondido golpe a golpe”.  No repertório dos shows, dificilmente  canções como Black is the colour e Everytime I feel the Spirit ficavam de fora.

A minha primeira favorita foi uma das mais conhecidas: My baby just cares for me. Com o tempo fui acolhendo Who Knows Where The Time Goes, I Love Your Lovin’ Ways e finalmente a versão de Here Comes The Sun. Heres Comes the Sun me causa a mesma sensação de Dear Prudence, dos Beatles. A explicação está no convite ao sol, na atenção. Não sei. Here Comes the Sun parece recado de mãe para filho. Eu me lembraria dessa música se quisesse dizer algo à minha mãe na noite em que ela me pegou no colo. Just Like a Woman também é linda.

Em agosto de 2000, no Festival de Jazz in Marciac, na França, Nina Simone subiu ao palco pela última vez. Morreu em abril de 2003, aos 70 anos. A declaração dada à imprensa foi que a cantora morreu de causa natural, e que já estava doente há um certo tempo. Eu gostaria de ter visto um show dela e de ter visto ela dançar rebolando tão elegantemente, como  a Julie Delpy descreveu em Before Sunset.

Amanhã

23/11/2008

Primeiro dia no trabalho novo. Que minha distração tenha piedade de mim. Que eu não derrame café no teclado.

: )

mas este lugar não existe

07/11/2008

eu não sinto um peito cheio. sinto falta de uma lua vazia tentando chamar a atenção. de um tomate mal cortado. de uma saudade com dono. um diálogo entre dedos. de paredes que desaforadamente enchem o espaço em que só cabe tu. sinto falta do incômodo da objetividade. de dormir sem anéis. de acordar com batuques de ursinhos. de encontrar três em um único um. eu sinto falta de ver um guarda-chuva colorido entre tantos outros pretos. ver um entre que é exato. ou um santuário de abraços que nunca tenham fim.

Os motivos da minha inércia

01/11/2008

Venho por meio deste singelo e um pouco preguiçoso post informar aos que por aqui passarem que estou viva, com relativa paciência, com apego fenomenal pelos meus dias de primavera, mas sofrendo de uma enfermidade que me afasta deste espaço. Chama-se, a maldita, Blogging Blues. Quem me alertou sobre ela foi a Sandra.

O que acontece então é que meus dias têm sido bonitos demais fora da internet. Tenho lido como nunca, aproveitado mais a companhia dos meus amigos, conhecido muita música. Tenho me olhado com um distanciamento agradável. Isso significa entender melhor algumas coisas, e simplesmente esquecer ou ignorar outras. Um pouco de tolerância faz bem. Mas principalmente, estou definindo o tema da minha monografia. Isso sim, tem sido trabalhoso. A confusão mental acontece porque eu gosto de temas diversos demais. Por enquanto, as palavras mais cogitadas giram em torno de (e olhem o porquê da minha neura em definir logo essa naba. Algumas coisas simplesmente não têm conexão segura!!): Schopenhauer, Foucault, Freud e Lacan (em linha conseqüente dentro do tema em estudo, inevitavelmente passarei por eles), literatura, loucura… Tá, esse é o surgimento de um dos temas em questão. A outra possibilidade é uma idéia mais antiguinha, tem a ver com a relação entre corpo e tecnologia e… Tá tudo verde demais. Tá tudo amplo demais. Há algumas semanas eu tive um fiozinho de certeza e quase saí pulando, mas logo vi que o que eu tinha definido era insuficiente.

Não vou me alongar muito aqui. Também não desativarei o blog. Nem penso nisso, aliás. Continuarei vindo, organizando algumas coisas, talvez colocando textos menores, respondendo. É só por alguns tempos, talvez dias, talvez semanas. Não sei, entende? Não estou abandonando NADA.

As fotos abaixo, encontrei no Flickr de uma moça chamada Alisa Nel Paese. A indicação estava na revista Soma que a Helena me mostrou. Muito boa, por sinal, e de distribuição gratuita. É uma publicação de São Paulo.

Bonito, né?

O Homem da Foto

16/10/2008

Refiro-me ao homem de terno escuro. Sei que essa foto foi tirada na Rua da Praia, aqui em Porto Alegre. Sem data. Sem circunstância. No names. O tempo amarelou tudo. Encontrei-a junto com outras tantas fotografias anônimas em uma caixinha, em um brique perto do Parque da Redenção. Paguei cinco reais por ela na época, acho que alguns meses atrás, talvez até um ano. Realmente, não me lembro. Comprei a foto por um motivo muito claro: o homem da direita só podia ser meu avô. Juro que naquele dia eu coloquei em dúvida qualquer possibilidade de aquilo ser uma coincidência. E ainda vivo fazendo isso em outros casos, papo pra outro post, ou não. Enfim. Comprei a foto, impressionada com o que estava acontecendo e tentando imaginar toda a história. Ih, viajei. Ficava imaginando como a foto dele havia ido parar naquele brique, e por que justamente EU, neta dele, havia tido a idéia de passar lá e olhar aquela caixinha de fotos de um monte de gente que eu nunca vi na minha vida. O que estava acontecendo era fantástico! E ainda por cima, eu queria amaldiçoar a criatura que havia vendido a foto dele para um brique. No dia seguinte, escaneei a foto e mandei para o meu pai.

Não. Não era o meu avô na foto, meu pai disse, “mas é muuuuito parecido”. Até agora fico olhando e não entendo tamanha semelhança. A verdade é que a foto adquiriu um valor sentimental grande para mim. Não sei quem são/eram essas pessoas tão elegantemente retratadas, mas elas agora fazem parte de uma história legal.

Ontem fez uma semana que o meu avô morreu. Foi na quarta-feira pela manhã*. Ainda pude ver ele com vida, falar com ele e receber resposta e até um sorriso há algumas semanas. Isso foi no hospital. A previsão era de que ele receberia alta logo e iria para casa. Um dia perguntei para ele quando ele voltaria para casa e ele respondeu, enfático, “AMANHÔ. É estranho e triste concluir que quando eu visitar novamente os meus pais, o quarto do meu avô continuará vazio, como se ele estivesse ainda no hospital. Não sei muito bem o que pensar. Acho que porque eu estou longe de casa a ficha está caindo aos poucos. Agora eu tenho somente minhas avós. E que bom, ainda tenho avós. Fico pensando que quando elas passarem a existir também somente nas minhas boas lembranças, como os meus avôs, uma coisa inevitável acontecerá: eu não serei mais a criança de ninguém. No fundo, para os nossos velhinhos a gente sempre vai ser a criança que eles viram nascer. Para eles, só o nosso corpo cresce, entende? Para nós, sempre vai ter colo.

Durante esses dias que eu passei no Mato Grosso, e que antecederam a morte do meu avô, pude conviver mais com meu pai. Eu conheço muito a minha mãe e me identifico muito com ela, mas meu pai ainda é uma página que estou aprendendo a ler. Ele é um pouco mais reservado. É brincalhão, muito brincalhão, mas algumas coisas simplesmente não fazem parte das nossas pautas, e isso me incomoda. É o jeito dele, eu sei. E talvez isso era o que eu nunca havia entendido: o jeito dele. A nobreza e o carinho com que o meu pai cuidou do meu avô durante o tempo em que ele esteve doente, passando noites em claro e jamais deixando meu avô sentir a tristeza escondida nos olhos do filho, eram-me estranhos nele. E adianto, não me eram estranhos porque eu não esperava isso dele, mas realmente porque eu não conhecia muito meu pai. Acho que uma semana ainda não foi o suficiente, mas esse tempo valeu por anos reticentes. Meu pai é doce, muito doce. Isso me deixa feliz, e ele nem imagina o quanto.

* Sabe, a resposta é: não se diz nada. As pessoas, nessas horas, não precisam de palavras ou de alguém falando do lado. Elas só precisam do silêncio quente de um abraço.

Mosaico Portenho

06/10/2008


A Sandra, minha amiga, mineira, hermana, eterno amor do Chico Buarque, anfitriã na Terra da Garoa em fevereiro deste ano, me encomendou um texto sobre as minhas impressões de Buenos Aires. Ainda moro nessa cidade! Me dei conta de que escrevi pouquíssimo, senão nada, sobre a minha viagem para lá no ano passado. O céu é um dos mais bonitos que eu já vi. Ou foram os dias. Ou as companhias. Ou o conjunto de tudo isso é que foi perfeito. O restante, algumas linhas recuperadas do meu diário de viagem, vocês podem ler no Isso é Bossa Nova. Ah, e a foto foi tirada a partir do gramado do parque ao lado do Cemitério da Recoleta.

Acima do Trópico

20/09/2008

“Este ano tá estranho, a Chuva do Caju* nem aconteceu”, meu pai me disse. Me disse ontem, quando começaram a cair os primeiros pingos d’água desde abril aqui, a 350 Km, mais ou menos, ao norte de Cuiabá. Procurem no mapa, chama-se Nova Mutum, a cidade. 25 mil habitantes, aproximadamente. Estou aqui!

Porto Alegre-conexão em Curitiba-escala em Campo Grande-Cuiabá. Mais cinco horas de carro e cheguei, na terça passada. 38 graus em Cuiabá, e eu me desmontando, porque saí de Porto Alegre com um casaco grosso. Da cultura, olha só, já ouvi rasqueado tocando no aeroporto. O Rio Cuiabá já me pareceu maior; talvez eu fosse menor. A mata que acompanha a BR tá seca. O cerrado só se mostra preto, queimado. Dá pena e revolta. Enquanto o inverno gela os pés dos gaúchos, a época da seca deixa a grama marrom e quebradiça aqui, bem acima do Trópico de Capricórnio. E não, não tá morta, por mais óbvio que isso possa parecer. É só o inverno passar e tudo volta a ter um verde completamente vivo. Sabe, o terreno aqui de casa tem grama até os fundos, e chega a dar um aperto no peito, porque as folhinhas estão todas secas. Sorte é que nem todas as plantas demonstram a mesma fragilidade. Então tenho bastante verde pra ver. No primeiro dia inteiro que passei aqui era ruim de respirar, porque o ar tá seco demais! Usamos umidificador de ar (confesso que eu nem conhecia isso). Enfim, depois da chuva forte de ontem, nesta madrugada a água caiu de vez. Chuvona! Hoje acordei e até usei um casaquinho.

Não estou falando sobre o tempo por falta de assunto, acreditem. Estou falando porque há dois anos eu não vinha pra cá e não me lembrava de como era tudo tão diferente. Aqui existem duas estações bem definidas e previsíveis: inverno SECO e verão CHUVOSO (só pra lembrar: Porto Alegre pode ter até quatro estações em um único dia). Estou me readaptando. E quando eu finalmente me acostumar com algumas coisas, já volto pra Porto.

*Chuva do Caju é como chamam aqui a primeira das chuvas fortes que acontecem em julho ou agosto. Essa chuva dá início à época de amadurecimento dos cajus.

** Vir pra cá é total aula de biologia. Geografia também.

***Estou com cheiro de cebola nas mãos. Hoje eu e meu pai dividimos o fogão :)

Terminei, finalmente:
– Os Melhores Contos de Loucura
– Entrevistas – Clarice Lispector

Lendo agora (e adorando!):
– O Retrato de Dorian Gray – Oscar Wilde
– Eu Receberia as Piores Notícias dos Seus Lindos Lábios – Marçal Aquino:

“De acordo com o professor Schianberg, não é possível determinar o momento exato em que uma pessoa se apaixona. Se fosse, ele afirma, bastaria um termômetro para comprovar sua teoria de que, nesse instante, a temperatura corporal se eleva vários graus. Uma febre, nossa única seqüela divina. Schianberg diz mais: ao se apaixonar, um ‘homem de sangue quente’ experimenta o desamparo de sentir-se vulnerável.”